15 de abril de 2009

Détourner le sens

Já reli os mandamentos da felicidade
Esperei para ver o sol se pôr
Tentei das vitrines as minhas vontades
Questionei ao mundo se era mesmo amor
Inventei na moça toda minha inspiração
Fiz do espelho meu melhor amigo
Esgotei a não tão incrível fonte da criação
E ainda não sei viver comigo

Onde estará o meu modelo?
Será que já morreu?
Como grito este apelo?
Que trilha a alegria percorreu?

Grito por mim num abismo sem eco
Ouço gritos que não sabem chamar
Sem mais vontade que dê certo
Sigo o conselho de, sem caminho, caminhar

A mesma água cuspida mata minha sede
No pântano escuro estendo minha rede
No cheiro de morte vejo meu deleite
No meu coração, o amor se rende
Deveras sei, ninguém sente!
Tudo só ilusão inoscente
Nada é permanente
Querem cliente
Ela mente
Sómente
eu?
dor!

4 de abril de 2009

Miopia Urbana

Hoje vi dois cavalos se banhando
Não havia peão, eram só os cavalos
Eles se jogavam na água empoçada
com tanta naturalidade que me assustou
E percebi que era assim,
na verdade sempre foi assim.
E digo:
se não fosse
o barulho no motor
o reflexo do vidro
gargalhadas ao meu lado
Jobim em meus fones
a cerca de morte e ferro
e a grande velocidade
Eu sentiria a natureza daquele momento
Senão fosse tudo isso
Me sentiria perto de Deus
não sei se seria bom
mas sentiria.

Bruno Faria

23 de março de 2009

Palavrar

Se braço de poltrona não abraça
Acho que a palavra perde graça
Se a boca do fogão não sente fome
Por que que tem o mesmo nome?
Se a mão do violão não pega nada
Acho que a palavra está errada
Se o fósforo tem algo na cabeça
Alguém me diz o que ele pensa
Desde quando pé de planta tem chulé?
Só se for essa planta do pé?
Quem for plantador de bananeira
Não terá seus pés no chão
Se o alho, cheio de dente, não mastiga
Eu acho que a palavra me castiga
Se a orelha do meu livro não escuta
Num existe palavra mais maluca
Se o cabelo, o milho, não penteia
Acho essa palavra meio feia
Se a perna tem batata e não frita
Pra mim parece esquisita
Se a gente não alcança, não importa
Mas se cresce e enxerga não suporta
E no fim a fantasia vai embora

10 de março de 2009

Do Tempo

Tenho saudades da vida de outrora
Um passado que falta em minha memória
Tão distante e cheio de glória.
O Chico concorda comigo
Mas por não ser meu amigo,
está sempre com uma pulga no ouvido
-Como pode saber sem ter vivido?
Não sei nem como digo.

A distância tráz beleza e coragem
Feio e covarde seria se fosse possível a viagem
Mas de cá... de longe... tudo é miragem
Acolho na força das ilusões passadas
o vigor para meu presente de nadas
Humberto também luta com essas espadas
Enfrentamos dragões e moinhos nessas caçadas

Não gosto desta minha época
onde tudo tem sua técnica
e exatidão na posição cênica
Não eram assim os heróis da Elis
havia liberdade para serem vis
para chegar ao ideal que eu quis
Não me basta, só, ser feliz

Iludido pela hipnose da ampulheta
meu sonho se esvai sem meta
Perguntei ao Jair se era a hora certa
Ele disse pra deixar isso pra lá
ir com laço firme e braço forte
pra que a vida não me entorte
Viver o passado é viver em morte
Cada um tem sua própria sorte

Esse conselho, fingi que não ouvi
Faz falta o que não vi, nem vivi
Se perguntarem, fui por aí
procurar Nara com a verdade
Quem sabe essa ilusão foi realidade?
Baseio-me nessa pequena possibilidade
Será que isso se chama saudade?

Bruno Faria

8 de março de 2009

Por hoje ser hoje

"Maria, Maria, é um dom, uma certa magia
Uma força que nos alerta
Uma mulher que merece viver e amar
Como outra qualquer do planeta
(...)
Mas é preciso ter manha, é preciso ter graça
É preciso ter sonho sempre
Quem traz na pele essa marca
Possui a estranha mania de ter fé na vida"
Miltinho

Por hoje ser hoje decidi postar essa letra que acredito ser uma homenagem para as que merecem ser homenageadas hoje.
Pois elas merecem ser "como outra qualquer do planeta" felizes.

Pela liberdade feminina!!!
abracos a todAs

3 de março de 2009

Sincronia

Todos assistimos maldade neste mundo
Todos nós sabemos o caminho do fracasso
Todos agradecemos o chão pra dormir
Todos nós vivemos pensando em morrer
Todos nós temos ouvidos, pois como iria ser?

Nem todos ouvimos por trás das palavras
Nem todos queremos que algo mude
Nem todos podemos contra a Vênus Prateada
Nem todos nos satisfaremos com tudo a comprar
Nem todos viveremos sem ter quem explorar

Ninguém gritará a verdade aos miseráveis
Ninguém levantará do seu sofá
Ninguém quebrará o sistema da injustiça
Ninguém se ofenderá com o ladrão que beija a mão

Pois...

Somos todos um bloco
Somos todos um só
Num mesmo naufrágio estamos
Quem aí sabe nadar?

Uma só marionete
Um só fantoche
Somos a Marinete, alguns o Dom Quixote
Apresentamos para o mesmo público que nos controla
Eles querem nos ver tomando Coca-cola
O que é bem fácil, aprendemos na escola

Os cavalos dão coice
Os leões rugem
Os gatos fogem
E João...
João?

João está decorando a musiqueta do espetáculo
o patrocínio quer saber se há verdade
nas palavras mentirosas que ele tem a dizer.
E João na sua canção:
- Eu estava desempregado não sabia o que fazer
Continuo sem trabalho mas tenho com o que bater
Peguei um dinheiro emprestado venham todos ver
Pago em 300 vezes com juros. Agora já posso ter
Aquele lindo carro, pra você eu vou dizer
Venha pegar emprestado. Nós gostamos de você!

Todos bateram palmas. A hipnose está completa.
João está feliz, mas seu vizinho não.

- Como ele pôde comprar? Minha mulher vai me largar.
O dele é mais bonito que o meu. Quando chegar ela vai pensar:
“Que carro lindo do João! Aqui não é o meu lugar.
Você merece um pé na bunda. Eu quero me separar."

Todos bateram palmas. O vírus é contagioso.
Daqui a pouco também estará o vizinho do João, luxuoso

Vamos todos ver o mundo num espelho!
E ai de quem meter o bedelho!

Bruno Faria

Este texto foi escrito há muito tempo, achei melhor não muda-lo pra manter sua identidade. Mesmo pensando em correções consideráveis.
Obrigado a todos

16 de fevereiro de 2009

O não-poema filosófico

A vida não faz sentido... é verdade!
As vezes tendemos a querer mistificar acontecimentos a fim de tornar grande algo que nasceu pra ser pequeno.
Digo "nasceu" intencionalmente pois a vida também nasceu...
de quem?
deus? Não, ele não existe!
Sabe, não há grandiosidade em ser vivo.
O fato de viver não nos eleva, pois na natureza tudo vive.
A natureza é uma só. Nós que somos plurais, individuais.
O resto é grupo, nós sozinhos.
São imortais pois são gênero.
Nós? Mortais solitários, morremos junto com nosso egoísmo.
Somos os únicos a andar em linha reta em um universo que anda em círculo.
Talvez essa seja a escolha, viver por um momento ou estar morrendo eternamente.
Concordo, a vida ainda não faz sentido. Mas e se fizesse? Como seria? Nos prenderiamos a esse sentido? Não... com certeza não.

6 de fevereiro de 2009

Curta Quinta

Amores da minha vida...
a primeira engravidou
a segunda se mudou
a terceira transviou
a quarta apenas continuou
a quinta ainda não veio
O velho vidente de quinta
quinta-feira me disse
que a quina era minha
no quinto sorteio ganharia
Melhor que a quarta seria
sem espaço para a sexta
Nenhuma vontade de voltar
Nenhuma fatalidade pro avançar
Satisfeito com o que tenho
do jeito como está
do jeito como estou
da forma que ficará
Quando irá eternizar?

31 de janeiro de 2009

Homenagem a uma tarde

Onde meus olhos não procuram mais,
seu cheiro descreve minha alma,
o silêncio se cala em meus ouvidos,
e teu toque fala à minha pele,
a mesma brisa toca, no mesmo instante,
meu rosto e seus cabelos.
O mesmo frio que constrange minha ação
aperta seu coração sedento por movimento
Ou estaria ele feliz nesse torpor?
Como esperar certeza de algo tão frágil?
Ou seria tão frio e invisível aos sentimentos?
O meu problema é querer saber
e o seu...
bem...
Não sei qual é o seu.
Só queria que soubesse de mim com alguma convicção
tirada de não sei onde
Só quero que seja em mim algo
Plausível de preferência...
Mesmo que não conte
que me queira, que me tenha, que me engane,
que me leve, que me use, me abuse,
me conheça, ou me negue.
Mas que seja pois já é.
E pergunto, esperando que digas com clareza:
Do que nunca vivemos,
devo sentir saudade ou esperança?

Bruno Faria